Editorial do Deputado Fabio Porta para a “Gazzetta diplomatica”

Venezuela: crise sem fim, italianos como reféns

Até poucas décadas atrás, a Venezuela era um dos países mais prósperos da América Latina, graças às maiores reservas de petróleo comprovadas do mundo. Hoje, é o exemplo dramático de como má gestão, corrupção e repressão política podem transformar um potencial em  crise imensa.

O PIB venezuelano caiu mais de 80% desde 2013, representando um dos piores colapsos econômicos em tempos de paz da história contemporânea.
Após ter atingido níveis extremos – com inflação de 10.000.000% em 2019 – a economia passou por uma aparente estabilização. No entanto, também neste ano (2025), segundo o Fundo Monetário Internacional, a inflação anual supera os 220%, uma das mais altas do mundo.
Mais de 20 milhões de venezuelanos vivem em condições de pobreza extrema, (cerca de dois terços da população).
O resultado tem sido um verdadeiro êxodo bíblico: de acordo com dados atualizados do ACNUR de 2025, 7,7 milhões de venezuelanos deixaram o país. A maioria foi para a Colômbia (2,8 milhões), Peru (1,5 milhão), Chile (470 mil), Equador (500 mil), mas também para a Espanha, os Estados Unidos e a Itália. Um fluxo que superou, em número, até mesmo a diáspora síria.

A emigração italiana para a Venezuela é uma história de sucesso. Nas décadas de 1950 e 1960, dezenas de milhares de famílias deixaram o Sul da Itália para Caracas, Maracaibo e Valência, contribuindo para a construção de bairros, empresas de construção, oficinas artesanais, fazendas agrícolas e comércios. Ainda hoje, mais de 130 mil cidadãos italianos estão registrados no AIRE (registro consular de residentes no exterior) na Venezuela. Algumas estimativas indicam mais de 1,5 milhão de pessoas de origem italiana, o que faz da nossa comunidade a maior entre as europeias no país.
No entanto, justamente essa rede tão enraizada é hoje uma das mais vulneráveis. A crise venezuelana atingiu em cheio famílias que, por décadas, encontraram estabilidade no país.
A isso soma-se o alerta das detenções arbitrárias: os números variam entre 11 e 22 italianos ainda presos, sem acusações claras nem processos transparentes.

O caso de Alberto Trentini, mantido preso por longo período sem acusações críveis, é apenas a ponta do iceberg. Muitos outros compatriotas continuam invisíveis tanto para a imprensa internacional quanto, frequentemente, para o interesse institucional de Roma.

A Itália tentou dar alguns passos. A designação do embaixador Luigi Maria Vignali como enviado especial para os italianos na Venezuela foi uma medida na direção correta.
Mas a não aceitação sofrida por ele em Caracas, em agosto, é uma prova evidente: Roma não pode enfrentar o problema com gestos simbólicos ou missões improvisadas. É necessária uma estratégia multilateral.
O objetivo deve ser duplo: a proteção imediata dos cidadãos italianos detidos, por meio de negociações diretas, talvez com o envolvimento da Santa Sé, que mantém na Venezuela uma posição privilegiada de interlocutora; e a reafirmação da presença italiana como ator diplomático na América Latina, evitando tornar-se irrelevante em uma região historicamente amiga.

Nos próximos meses, acontecerão eventos que podem ser decisivos: a Conferência Itália-América Latina e a canonização, em Roma, de um santo venezuelano.
São oportunidades que o nosso governo deve aproveitar para colocar a questão dos detidos italianos na mesa das relações bilaterais.

Na arena internacional, o caso da Venezuela parece ter saído dos holofotes, ofuscado pelas guerras na Ucrânia e na Palestina.
No entanto, o que acontece em Caracas não é menos grave. Trata-se de uma crise humanitária crônica, onde liberdades fundamentais são violadas diariamente e milhões de pessoas são forçadas a abandonar seus lares para sobreviver.

Para a Itália, essa não é uma crise distante: é uma crise que toca diretamente nossas famílias, nossos compatriotas e nossa credibilidade internacional.
O Parlamento e o Governo italianos têm hoje uma responsabilidade histórica: trazer de volta para casa os cidadãos detidos e garantir proteção real à comunidade italiana na Venezuela.
Não se trata apenas de solidariedade ou de retórica: trata-se de um dever constitucional, moral e político.
Cada dia que Alberto Trentini e os outros continuam presos representa uma derrota para os direitos humanos e para a democracia.
Não podemos tolerar que a vida dos nossos compatriotas continue refém da repressão e do silêncio diplomático.

A Itália deve falar com uma só voz: a da dignidade, da liberdade e dos valores que nos definem como comunidade nacional e internacional.
Não há mais tempo a perder: é necessária uma missão política imediata e resolutiva.

Curta e compartilhe!